Democratização do acesso ao ensino superior público: é possível em tempos de repressão ao movimento estudantil?
“Ou os estudantes se identificam com o destino do seu povo, com ele sofrendo a mesma luta, ou se dissociam do seu povo, e nesse caso, serão aliados daqueles que exploram o povo”. (Florestan Fernandes)
Faz exatamente 27 anos que a ditadura empresarial-militar findou-se no Brasil. Findaram-se as torturas militares financiadas por grandes empresários e dava-se início a abertura democrática com eleições diretas para presidente conjuntamente em um contexto mundial no qual a queda do muro de Berlim era propagandeada como o fim dos regimes autoritários no mundo e a abertura de uma nova era de paz e felicidade para a humanidade.
Junto ao triunfo da democracia em escala mundial, percebe-se nas últimas duas décadas um intenso movimento de enxugamento do papel do Estado, o qual é conhecido como neoliberalismo e que se manifesta na retirada de direitos sociais historicamente conquistados pelos trabalhadores como saúde e educação gratuitas, além de direitos trabalhistas como férias, licença maternidade e 13º salário.
No Brasil, o neoliberalismo ganha força nos anos noventa, e na educação vemos a transformação do direito educacional do trabalhador em uma mercadoria a ser oferecida por empresas privadas. Atualmente vemos a presença dessa lógica no ensino superior através de programas de fomento financeiro para grandes grupos empresariais das redes privadas (PROUNI), do sucateamento das instituições públicas através de progamas de expansão física sem expansão financeira e de pessoal (REUNI) e também através da abertura das universidades públicas às organizações estatais de direito privado que influenciam diretamente pesquisas e indiretamente as aulas dos estudantes.
Com o processo de retirada de direitos historicamente conquistados, fato que já coloca em cheque a propaganda ideológica neoliberal de triunfo da democracia, percebe-se por parte do Estado um grande ataque as organizações da classe trabalhadora que discordam de tal ideologia.
Ações como a repressão ao direito de greve, a perseguição política de dirigentes sindicais manifestada por demissões e de dirigentes estudantis por reprovações, além do uso da força policial e militar são estratégicas para reprimir manifestações populares. É a lógica da democracia neoliberal; repressão para os trabalhadores e democracia para as demandas do capital.
Esta repressão, longe de ser componente apenas dos livros de História, pode ser vivenciada hoje quando presenciamos nos últimos meses a remoção truculenta por parte da polícia e do governo do estado de São Paulo de 9 mil pessoas que ocupavam a área da comunidade de Pinheirinhos; a desocupação da Cracolandia exonerando o papel do Estado e perpassando um caso de saúde pública a um caso de polícia; a repressão policial aos atos contra o aumento abusivo das passagens de ônibus em Teresina/PI e Recife/PE; e a desocupação da reitoria da USP que contabilizou 400 policiais e acarretou 73 presos políticos.
A repressão na USP demonstra que a universidade vivencia em si as disputas e contradições que ocorrem no seio da sociedade de classes e, caracteriza que quando os interesses econômicos da classe dominante são questionados, a repressão e perseguição política manifestam-se também no espaço da universidade. Isto ainda pode ser visto na lógica de gestão antidemocrática das instituições, fruto da reforma universitária do período da ditadura empresarial-militar que estabelece uma hierarquização entre professores, técnico-administrativos e estudantes, e se estrutura pela divisão no peso de voto de 70-15-15 nos processos decisórios.
O movimento estudantil, na defesa de suas pautas históricas da democratização do acesso ao ensino superior público e da gestão democrática da instituição universitária, compreende que este espaço deve possibilitar o livre acesso e circulação do conhecimento crítico ao conjunto de estudantes de acordo com as demandas e necessidades da classe trabalhadora. Por isso, nós da ExNEEF entendemos que universidade não condiz com repressão, mas sim com livre manifestação do pensamento. Ela não condiz com autoritarismo, mas sim com debate e contraposição de ideias.
Por fim, diferentemente, do que a ideologia neoliberal propagandeava em meados da década de 90, percebe-se que não vivemos em uma nova era de paz e felicidade para a humanidade, entretanto em um período de manutenção da lógica opressora da sociedade de classes.
Desta forma, reafirmamos a pauta de democratização da universidade pública, entendendo que esta, diferentemente daqueles que defendem a reforma universitária de Lula/PT, não pode ser descolada da luta pela construção de uma sociedade livre de opressões, na qual o trabalho deve ser a base de toda a sociedade, permitindo-nos ser “humanamente diferentes, socialmente iguais e totalmente livres”.
Executiva Nacional de Estudantes de Educação Física
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